Cada pessoa lida com os acontecimentos do seu jeito. Isso me fascina.
Isso me assusta, também. Tem
gente que é de
guerra, gente de paz, e ainda há aqueles que preferem manter-se alheios a tudo que se passa ao seu
redor.
Certo dia olhei para os meus pés e vi que não mais havia âncoras presas aos meus tornozelos. Noutro dia estava
em outro mar, depois em outro, em outro… me acostumei a apenas assistir de
longe a segurança da terra firme. Ela já não me atrai mais. Seria essa, a vida que eu sempre procurei? Aí é que reside o cerne da questão. A vida que eu sempre procurei é, justamente, viver procurando.
É eternamente cavar fundo até encontrar, em peito alheio, um coração parecido com meu.
—
Celular piscou.
—
Tenho desistido da ideia de eterna felicidade. Desisti. Os momentos que
a gente chama de bons momentos só são
chamados assim porque existem também aqueles que queremos esquecer. Bons momentos são bombas de endorfina que amolecem os espinhos que
nos insistem em perfurar as partes onde nossa pele é mais fina. E essas partes são muitas, principalmente quando estamos despidos
de armadura (sempre?). Tendo isso em mente, faço o que está ao
meu alcance para que esses momentos sejam numerosos, visto que eles jamais são duradouros. Endorfina vicia.
Tenho assistido a guerras, e não são as
da tevê. Em
mares que tangem os meus, existem explosões tentando atrair meus olhos. Explosões que pulverizam no ar todo tipo de sentimentos nocivos, perigosos.
Quando tudo na nossa vida está em seu devido lugar, não nos passa pela cabeça a ideia de propalar aos quatro ventos essa falsa felicidade. Muito
menos, os espinhos, que são de
verdade. Forjada com lágrimas
contidas, a felicidade anunciada se derrete com a chegada do primeiro sinal do
amanhecer. Eu já fui
para longe, e te deixo ir, contanto que não olhes mais para trás. Não com
essa cara, e não com
essas palavras escritas na testa.
Como é que
tu pretendes lidar com isso? Conheço mil formas de se proceder; mais da metade delas parecem mais sensatas,
ao meu ver. Nessa constante mudança de mares, tenho fugido para cada vez mais longe da fumaça dessas explosões. Hoje, distante a ponto de te ver como um minúsculo ponto próximo à curva
do horizonte, encontro-me às portas de uma nova vida, aquela vida que eu sempre procurei: viver
procurando. A memória
recente de uma longilínea
silhueta ornada pelos iluminados prédios da metrópole,
mesmo sendo fruto de um mero retrato imaginário e possivelmente efêmero, tem me guiado para longe da tua guerra. E para cada vez mais longe
da terra firme. Aqui a água é fria, e a hipotermia me força a dar braçadas cada vez mais convictas, em sentido oposto ao dos teus passos.
—
Celular piscou de novo. Ainda não. Ich V. D.
—
As baixas que a nossa guerra fria estampa nos jornais são justamente os sentimentos bons, os sorrisos
verdadeiros e as memórias
que valiam a pena serem guardadas.
Mortos um a um, restam apenas os feridos: eu e tu.